quarta-feira, 7 de novembro de 2012

O FURACÃO “IMPACIÊNCIA”: RELEMBRE OS DISCURSOS FURIOSOS QUE MARCARAM NOSSA TELEVISÃO


Até que ponto o ser humano é capaz de controlar uma indignação? Hoje estive relembrando algumas personalidades corajosas que, num passado não muito distante, romperam as barreiras da acomodação, quebraram protocolos e soltaram o verbo para expressar suas  indignações em relação a velhos problemas do nosso BrasilZÃO.

Vamos a um exemplo recente. Todos os grandes veículos de comunicação noticiaram a passagem destrutiva do furacão Sandy pelos Estados Unidos.  Leitores, ouvintes , telespectadores e internautas foram bombardeados com tantas reportagens sobre os estragos da tormenta.  Jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas arriscaram suas vidas para fazer uma cobertura plausível e genuinamente profissional. Até aí tudo bem.

Acontece que esse mesmo furacão passou dias antes pela Jamaica, Cuba e Bahamas causando estragos iguais ou até maiores do que na terra do Tio Sam. Na Jamaica, por exemplo, segundo a rede pública EBC, 75 % da população ficou sem energia elétrica.

 É claro que não posso ser ingênuo aqui a ponto de não saber quais são os ‘critérios de noticiabilidade’ do Jornalismo, ou seja, o que as redações levam em consideração para um fato virar, ou não, notícia, como a ameaça a sociedade, a brutalidade e outros. Até porque isso é muito bem ensinado na academia. Agora ficar sem dar uma ‘notinha pelada’ sequer no Jornal Nacional ou um breve texto no Radar da Veja, achei um pouco exagerado.  Não vou nem falar que em alguns lugares do Nordeste, aqui no Brasil, não chove há quase um ano. E aí? Cadê a repercussão?

Mas tudo bem. Isso foi só um exemplo de indignação. Não tenho perfil de reclamão. Ainda sou equilibrado a ponto de controlar algumas fúrias. Então vamos aos recentes casos conhecidos de decepção veiculados na nossa televisão.

O primeiro desses desabafos,  em rede nacional, foi ao ar em março de 2011. A apresentadora Raquel Shererazade, da TV Tambaú, filiada do SBT em João Pessoa, na Paraíba, faz uma dura critica ao Carnaval. O vídeo ganhou tanta repercussão que, meses depois,  a jornalista foi convidada a trabalhar no Jornal do SBT, o principal noticiário da emissora. Vale a pena rever. Clique aqui.

Em abril do mesmo ano, no Jornal do Meio-Dia, também do SBT, o comentarista Luiz Carlos Prates,  revoltado com o fato de a Academia Brasileira de Letras agraciar o jogador Ronaldinho Gaúcho com a Medalha “Machado de Assis”,  faz um discurso furioso em defesa da meritocracia. Tire suas próprias conclusões clicando aqui.


Mas nada se compara ao discurso ousado da professora potiguar Amanda Gurgel, em maio de 2011. Durante uma Audiência Pública na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte, a docente falou da má qualidade do ensino público, reclamou da baixa remuneração dos professores e denunciou as condições precárias no local de trabalho. Autoridades políticas presentes na audiência tiveram de ‘engolir seco’ o desabafo da educadora. Relembre clicando aqui.


quinta-feira, 1 de novembro de 2012

RESENHA: "ILUSÕES PERDIDAS", DE HONORÉ DE BALZAC


Capa do livro Ilusões Perdidas(1837)
Por: Andre Souza

Em Ilusões Perdidas, de 1837, Honoré De Balzac narra a vida do poeta e jornalista Luciano de Rubempré, um jovem nascido no interior da França que arrisca o próprio talento e inteligência na busca por uma carreira de dinheiro e sucesso na capital Paris. Escrito durante toda a carreira literária do autor, a obra aborda desde o trabalho maquinário nas tipografias até o espírito competitivo, antiético e manipulador dos jornalistas do século XIX.
A obra é dividida em três partes. A primeira delas, “Os dois poetas” narra a trajetória de dois amigos, Luciano de Rubempré e Davi Séchard, ambos nascidos na província francesa de Homeau, recém formados e ansiosos para lidar com os desafios da política e o desenvolvimento tipográfico e literário. Luciano, o protagonista, mais vaidoso, belo e inteligente, deixa a vida interiorana onde residia sob o afeto da mãe, irmã e o amigo para ir à Paris com a Srª. de Bargeton, uma nobre aristocrata da província de Angoulême que, encantada com a beleza do jovem, lhe promete a tão sonhada ascensão social.
Honoré De Balzac cria um ambiente de comparação entre os dois primeiros personagens para ilustrar o verdadeiro significado da obra: mostrar que as escolhas erradas podem gerar consequências graves. David, mais maduro, realista e trabalhador, se opõe a todo instante a Luciano, moço seduzido pelas oportunidades da cidade grande, protegido pelos entes queridos e arruinado pela tirania dos jornalistas. Nesse contexto, Balzac expõe, por meio do personagem David, toda a sua opinião contrária aos jornais da época, mostrando que é possível fazer o caminho da literatura sem se apegar a esse “bastão pestífero” [jornalismo].
Luciano de Rubempré escrevendo uma carta.
Na segunda parte, “Um grande homem da província em Paris”, Balzac relata os caminhos tomados por Luciano após chegar à cidade-luz. Devido a sua origem provinciana, o poeta enfrenta vários problemas da cidade grande. Primeiro, ele se vê abandonado por sua amada Srª de Bargeton. Depois, sozinho, tenta publicar seus poemas nas editoras, sem sucesso. Entra no Cenáculo e faz grandes amizades. Semanas depois, graças a um artigo sobre uma peça de teatro, passa a integrar a lista dos jornalistas de Paris.
A partir desse momento, o autor começa a apresentar uma série de atitudes antiéticas relacionadas ao ofício de jornalismo. O mais evidente é o uso do poder para manipular as massas em benefício próprio, ou seja, utilizar-se dos jornais para atacar autoridades e inimigos, saciando as próprias vontades e vaidades. Exemplo disso é quando Luciano abandona os amigos do Cenáculo para garantir lugar entre os jornalistas. Graças ao status proporcionado pelo novo ofício, o jovem passa a conviver no mundo dos romances, da luxúria, inveja e competições perigosas que lhe custariam caro. O poeta, seguro de suas conquistas e ambicionado pela riqueza, muda de posição política, opõe-se aos ex-amigos de profissão e acaba por cair nas armadilhas dos inimigos de imprensa.
O crítico do Jornalismo, Honoré De Balzac
Outro tema abordado é a competição entre os jornalistas. Apesar de ter sido escrita no século XIX, a obra está bastante ligada aos problemas contemporâneos do jornalismo. Assim que chega a Paris, Luciano lida diariamente com a burocracia das editoras, redações jornalísticas e, principalmente, o temperamento dos profissionais da imprensa. Prova disso é o trecho onde Finot, dono de um dos jornais de Paris, dialoga com um recém contratado. “Quero continuar redigindo a redação e lá conservar todos os meus interesses sem parecer intervir em coisa alguma. Quero ficar com o direito de mandar atacar ou defender, no jornal, os homens e os negócios que entender deixando te satisfazer os ódios e amizades que não interfiram com a minha política” (pág. 161)
Nesse sentido, a narrativa aponta para uma realidade atual em grande parte dos veículos de comunicação. Os jornalistas são apenas os homens que seguem a linha política e editorial dos jornais. As juras de prestação de serviços e defesa dos interesses públicos a qualquer custo estão cada vez mais extintas. Balzac, um nato crítico do jornalismo da época, usa outra personagem para expor as opiniões sobre a polêmica instalada na história. “O jornal, em vez de ser um sacerdócio, tornou-se um meio para os partidos, e de um meio passou a ser um negócio” (pág. 175).
A riqueza de detalhes da obra é evidente. Bastante extenso, o texto descreve cada cenário, diálogo e intenções das personagens de forma que o leitor compreenda claramente os desdobramentos da história. O clímax parece ser constante, ao fim de cada capítulo. A sensação é de que o leitor deveria aconselhar Luciano em suas decisões, mas o protagonista insiste em seguir os caminhos errados. A intenção do autor é segurar a atenção do leitor até o final , de forma que ele descubra qual será o fim do jovem poeta.
Na terceira e última parte da obra, “Os sofrimentos do inventor”, como o próprio nome diz, Balzac se preocupa em descrever as provações de Luciano. Ao se deparar com a doença, a perda da amada Corália, a pobreza e a solidão, o poeta reconhece que toda a sua glória foi destruída na mesma velocidade que foi conquistada.
Ilusões Perdidas, obra rica de ensinamentos relacionados ao jornalismo e a literatura, pode também ser considerada uma história de lição de vida para jovens profissionais que arriscam os próprios princípios em busca de fama e dinheiro. Longe de ser um simples romance de costumes, a obra leva o leitor a refletir sobre até quando vale a pena arriscar riquezas morais em busca de riquezas materiais. Já no campo jornalístico, o principal ensinamento refere-se a ética na profissão. Apesar de a maioria das redações jornalísticas enfrentar crises financeiras e político-partidárias, os profissionais devem priorizar a ética e o interesse público, e não sustentar um perfil de vaidades,  prepotência e submissão aos interesses comerciais.